Entenda o que acontece com a Rede Transamérica

microfone com o logotipo da transamérica fm, apoiado sobre uma mesa de som.

A venda da frequência 100,1 de Salvador para um grupo de investidores baianos é um dos indicadores que sinaliza um possível desmonte da rede Transamérica, emissora que opera nessa mesma faixa do dial em São Paulo. 

No dia 16 de agosto, entrou no ar em Salvador, a Antena 1 100.1 FM. A afiliada da rede adulta-contemporânea retorna a Salvador após 15 anos ausente, substituindo a Transamérica, que estava no ar de forma ininterrupta há quase 45 anos. A emissora baiana foi vendida para um grupo de investidores locais: Ricardo Luzbel (Portal Bahia Notícias), Ana Coelho (TV Aratu/SBT) e Léo Góes (Piatã FM/On Line Entretenimento), após diversos rumores que começaram a aparecer em maio, negados pela própria Transamérica e foram confirmados oficialmente em julho.

Se trata de uma movimentação já prevista pelo mercado após a morte de Aloysio Faria, dono do Conglomerado Alfa, em 2020. A ordem das cinco herdeiras é se desfazer de todos os ativos, que começou com a venda do Banco Alfa para o rival Safra, por pouco mais de R$ 1 bilhão. Após cinco dias, foi oficializada também ao Safra, a venda do Delta Bank, que opera em território estadunidense. Logo em seguida, a rede de materiais de construção C&C foi vendida a Arcos Gestão e Investimento (AGI) e que atualmente está passando por uma reestruturação, com diversas lojas fazendo promoções de encerramento.

Além disso, foi vendido o terreno onde funcionavam o Hotel Transamérica e o Teatro Alfa em Santo Amaro, próximo a Marginal Pinheiros. A promessa é da construção de um clube de luxo que promete até ondas artificiais e tem cotas a partir de R$ 600 mil. Outro, na Barra da Tijuca com 30 mil m², foi vendido por R$ 370 milhões para as incorporadoras Tegra e São José.

O conglomerado ainda contempla a rede de hotéis Transamérica, sorveterias La Basque, a fabricante de bebida Águas da Prata, a fabricante de óleo de palma Agropalma e a Rede Transamérica, que vamos aprofundar melhor.

A Transamérica começa sua história no Recife, em 1976. A 92.7 foi a primeira FM do nordeste e entrou no ar com uma programação adulta voltada para os públicos classe A/B. No mesmo ano vieram Brasília e São Paulo, e no ano seguinte, Rio de Janeiro e Curitiba. A capital baiana surge na rede em 1980. Das emissoras próprias, Belo Horizonte veio só em 1995, com a aquisição da instrumental Scala FM. Nos anos 80, adotou a linha que tornou a emissora conhecida em todo Brasil: programação jovem com humor escrachado e deboche aos ouvintes.

Isso levou a emissora à liderança em diversas praças. Até 1980, a programação era toda gerada em São Paulo e enviada para as demais emissoras por fita de rolo. Depois apostaram em programação local, até a implantação do satélite nos anos 90, onde passou a ser 100% em rede. Ali, a Transamérica deu seu primeiro salto com uma grande expansão que estagnou em 1995 com a chegada da Jovem Pan, que apostava forte em dance music, e das rádios populares inundadas de axé e pagode. Inclusive, isso “forçou” a emissora de Salvador a tocar axé em determinados horários, tal qual a do Rio tocava funk.

A rede seguiu nessa base até 1999, quando decidiu seguir um formato que perdurou por 20 anos: trabalhar com três formatos de programação: o jovem/pop, com a Transamérica POP; o adulto-contemporâneo, com a Transamérica Light; e o popular/hits, com a Transamérica Hits. A portadora POP seguiu a linha anterior razoavelmente bem, mantendo alguns clássicos da grade, como o “Naftalina”, “Clube da Insônia” e “Estúdio Ao Vivo” (até hoje no ar), com a maioria das emissoras próprias seguindo esse padrão e tendo um bom número de afiliadas. Além disso, diferentemente das outras duas vertentes, a POP abriu espaço para o futebol. Em São Paulo, a equipe é comandada por Éder Luiz.

A emissora de segmento Hits foi a maior de todas: tinha uma boa quantidade de afiliadas, porém em sua maioria, em cidades médias/pequenas, apostando no feijão com arroz das rádios ecléticas. Era um híbrido de sertanejo, música romântica e grandes sucessos que tocaram nas novelas da Globo, movimento evidenciado com o “Love Hits” de Cido Gameiro. A Light tinha uma programação gostosa de ouvir e uma plástica bacana, porém a procura de emissoras para se afiliar foi ínfima, tendo a 95.1 de Curitiba por bastante tempo como a única emissora da vertente.

Na mesma época, a Transamérica também contava com emissoras em território internacional, como a Transamérica Japan (entre 2005 e 2009, com 4 emissoras em território japonês) e uma filial da portadora Hits em Boston no ano de 2014.

Na onda de corte de custos, em 2019 resolveram unificar todas as programações em uma só, usando como base a Pop. Foi adotado um formato jovem/adulto com foco no pop-rock que causou imediatamente uma debandada em afiliadas, principalmente da Hits. Boa parte das emissoras migrou para outros projetos populares, como Clube FM Brasília (105.5), Band FM São Paulo (96.1), Massa FM São Paulo (92.9), Nativa FM São Paulo (95.3) e a flexível Rede UP.

A parceria com a CNN Brasil, oficializada em 2020 só derrubou mais ainda a rede, com a obrigatoriedade da transmissão noticiosa. O acordo entre as partes terminou em dezembro, os detalhes dessa história você acompanha aqui. Apesar disso, algumas afiliações ainda ocorreram, como Campinas e Porto Velho. A programação musical variava bastante, chegando a adotar o rock de forma mais ampla em 2022/2023.

Em 2024 houve um novo reposicionamento: o retorno do segmento adulto-contemporâneo. Com uma plástica refeita baseada em antigas vinhetas do Roupa Nova, a rede tenta se sustentar, mas a saída eminente de alguns comunicadores (como Anderson Soncini e Mari Merigo) e fim de programas como o “Conectados”, escancara o eventual desmonte da rede. O que segura um pouco as pontas, é o esporte, que traz faturamento, e consequentemente, investimento (como a compra dos direitos da Copa do Mundo Masculina e Feminina, Mundial de Clubes e Jogos Olímpicos). A venda da emissora de Salvador mostrou que, quem chegar com dinheiro, leva. Além disso, em uma das últimas edições da programação local na emissora baiana, foi dito que a emissora de Recife também foi vendida. É uma informação preliminar que indica que as emissoras estão sendo vendidas individualmente.

Na listagem de afiliadas, sobraram apenas Porto Velho, Campinas, Governador Valadares, Mococa, Aracaju, Juiz de Fora e Balneário Camboriú, que curiosamente saiu na chegada da CNN e depois voltou. A de Barreiras irá para a Band FM em outubro, e a de Maceió vive com problemas técnicos, saindo do ar com frequência, Essa, nem consta mais na lista de afiliadas.

Falando do mercado da comunicação, a Transamérica Salvador não é a primeira rádio vendida pelo grupo: em 2021, a Transamérica Light 95.1 FM de Curitiba foi vendida ao empresário Amarildo Lopes, parceiro da CBN em Londrina, que assumiu a afiliação da rede noticiosa também na capital paranaense, interrompendo a longa trajetória da emissora como rádio musical. Ela pertencia ao conglomerado desde 2000.

Além disso, operaram um canal de TV aberta na mesma cidade, a TV Transamérica, encerrada um ano antes. Transmitida pelo canal 59 UHF, ela tinha uma programação independente nos seus últimos anos, embora transitou por diversas redes nos anos 90 e 2000, como a RECORD e a Rede Manchete. A pretensão do grupo ao adquirir a emissora, era formar uma rede jovem para concorrer com a MTV, mas que não saiu do papel. A sede e os equipamentos, foram todos vendidos. Ironicamente, a TV e a rádio citadas acima, pertenciam à Exclusiva Produções.